Essa afirmação vem me consumindo há
um tempo, principalmente para mim, que teve toda uma vida pautada nos problemas
que enfrentei, as angústias que eu senti e a forma com que eu saí de situações que
na maioria das vezes foram péssimas. Não consigo me lembrar como era minha vida
no inverno de 2012, mas me lembro especificamente que naquele momento da vida eu
chorei em um bar sujo da Rua Augusta, lembro com riqueza de detalhes de tudo o
que eu senti, de toda a dor acumulada e de todas as coisas maravilhosas que
nasceram daquela dor.
Hoje, porém, me olho no espelho
do meu banheiro depois de duas taças de vinho e a única frase que passam pela
minha mente é: “Está tudo bem”, o que para a maioria das pessoas que eu conheço
seria uma forma de alívio, uma conquista depois de anos de luta, mas para mim
que pensa demais, é uma ideia que aprisiona.
O sofrimento absoluto me levou
para lugar que eu nunca iria se estivesse “tudo bem”, todas as paixões falidas,
os amigos que se afastaram, as frustrações profissionais, a rejeição, a solidão,
o desconhecido, me fizeram chegar mais longe, me tornaram mais criativo e cada
vez mais dono de mim, cada vez mais próximo da pessoa que eu esperei ser, mais
próximo do meu próprio paraíso artificial.
Existem diversas vantagens neste
meu novo eu e gosto delas, mas é difícil se tornar outra pessoa estando tão acostumado
com a antiga, é difícil pensar nos problemas e encontrar soluções para eles de
forma prática, é difícil ser o total oposto de um modus operandi que te
deixava em pé.
Dia desses eu sofri, o fluxo de
pensamentos ficou abalado, ouvi músicas triste enquanto tomava um banho quente,
chorei na cama abraçando o travesseiro, tive uma pequena crise de ansiedade e dormi.
Acordei bem, consegui analisar a situação e ela passou, a angústia foi embora e
segui com a vida, trabalhei, estudei, comprei novos panos de prato, fiz a barba
e quando me deitei novamente na cama, não senti nada – talvez uma pequena
vontade de rir do sofrimento das últimas 24 horas.
Não que esta seja uma reclamação,
tudo foi construído de forma homeopática, uma mistura de várias horas de análise
lacaniana, alguns boletos para pagar, treinos de respiração e um bocado de problemas
para resolver. Acho que essa é a transição natural, é o momento em que se
entende que a vida é finita e que se tem muito para realizar, para construir,
para imaginar.
Eu não sou mais o mesmo e isso é
bom, hoje já não me exponho em praça pública como antigamente, já não choro em
banheiros e, principalmente, não sofro com dores que racionalmente eu tenho o
poder de evitar.
Hoje está tudo bem! Fazer análise,
ter problemas, chorar só quando é muito necessário, as taças de vinho, ver as desigualdades
do mundo, o preço da gasolina, o governo, os problemas de família, a conta de
luz, o medo de envelhecer, a janela com a luz acessa, a correria, o despertador
que insiste em interromper o sonho, as reuniões no zoom, os remédios naturais e
os tão-não-naturais-assim, tudo isso me tornou o que sou hoje.
Mas se em algum dia você precisar
chorar num banheiro sujo, me liga, deste sentimento eu entendo bem.