Sobrevida.

Ela já estava amarrando os cadarços, mas aquele dia acabara de começar, mas nada fazia com que o cansaço de uma vida inteira sumisse das suas costas. Uma longa e pesada vida que motava nela, mesmo tendo apenas vivido vinte e poucos invernos (eram o que diziam seus documentos), mas a falta de ar pelos muitos cigarros e a dor de cabeça de não saber realmente quem era não a deixavam respirar.

Seus ossos doíam, assim como suas pernas, mas nada se comparava ao estrago em que se encontrava seu coração, que também existia a apenas alguns invernos, mas a sensação térmica de exaustão o tornava febril, todo o seu corpo era febril, mas ela estava em julho o que não ajudava muito, já que o sentimento de que deixara a vida passar sem realmente existir, batiam muito mais forte na metade do ano (ou dos anos, já que ela não sabia a quanto tempo estava presa naquele fraco corpo que apenas bombeava sangue e fluidos) ela não se lembrava da ultima vez que se sentiu viva.

Algo nela pedia uma reação, algo queria que tudo mudasse e que seu olhos parassem de derramar aqueles jatos de água salgada que ela engolia sem sucesso, mas o pedido era muito baixo, muito fundo e muito longe para que ela pudesse se agarrar a eles. Ela queria se segurar a algo, mas não se lembrava da última vez que foi abraçada, nem tocada. Nem ela mesma se tocava, pois tinha um temor sobre o que iria encontrar sobre a sua pele.

Ela que era uma fração de alguém que um dia viveu, que não conseguia erguer a cabeça ou amarrar os próprios cabelos, resolveu tirar os sapatos, deitar-se na cama que nem teve tempo de esfriar e se entregar.

Amanhã tentará novamente.

Tentará novamente.

Novamente.

Amanhã.